quarta-feira, 4 de novembro de 2009

A Ilíada e suas repercussões homéricas – Parte II

Aquiles fala com Ulisses.

Paula Starke


Como dito anteriormente, na Ilíada os deuses aparecem como personagens atuantes. Surgem ao lado dos mortais como si mesmos ou disfarçados. No Livro I, além da aparição de Apolo, se pode citar como exemplo a conversa entre Aquiles e Atenéia que, enviada por Hera, persuade o guerreiro a dominar sua ira.

Enquanto Apolo, Ares e Afrodite apóiam os troianos, Atenéia, Hera e Poseidon estão do lado dos gregos; interessavam-se pela guerra como os próprios gregos e troianos. Apesar de saberem que os gregos ganhariam a guerra, os deuses insistiam na intervenção, na esperança do que talvez pudesse mudar.

Esses deuses, portanto, não são descritos como seres mais “evoluídos” em termos de consciência ou sempre imparciais, pelo contrário, existem e atuam à imagem e semelhança dos mortais. São vaidosos, cheios de ódio, enganam uns aos outros e interferem a todo o momento na vida dos mortais visando seu próprio interesse.

Em Fúria de Titãs de Desmond Davis, 1981, alguns deuses como Zeus, Hera e Afrodite são representados e também influenciam na vida dos mortais. Zeus intenciona proteger Perseu, seu filho com a mortal Dânae.

Na mitologia, cronologicamente falando, Agamenon veio depois de Acrísio, já que se tornou rei de Argos cerca de cinco gerações depois de Perseu. Um fato curioso no longa-metragem é o aparecimento do “vilão” da história Cálibos, que seria filho da deusa Tétis. Pelo que se registra, nunca houve tal ser na mitologia. Sabe-se que o conhecido filho de Tétis foi Aquiles, a quem a Ilíada se dedica em grande parte.

Apesar de algumas “falhas” quanto ao que realmente foi registrado pela mitologia, Fúria de Titãs é interessante aos olhos do espectador e apresenta os deuses com descrições semelhantes às de Homero. São ambiciosos, exercem sua influência a todo o momento no destino dos mortais e algumas vezes são até irônicos.

Na Ilíada as descrições dadas por Homero não são uma retratação exata das crenças que dominavam em sua época; ele mistura algumas fases da religião descrevendo os deuses por uma visão “ideal”. Um passado micênico da Europa é mesclado a um presente asiático se tornando uma realidade apenas poética. O que temos então registrado por Homero, são documentos de grande valor quanto à religião, mas incompletos.

Alguns conceitos utilizados na Ilíada não passavam de “inspirações” baseadas no que ocorria na sociedade. É bem possível, através da obra, ter conhecimento de como de desenvolveram as cidades no período arcaico. A assembléia e o conselho são duas organizações essenciais expostas na obra. A assembléia é a convocação de todos os guerreiros por Agamenon, enquanto que o conselho reúne uma elite dos guerreiros mais idosos. A noção de “maioria” é igualmente representada, como quando uma porção de guerreiros vai pedir a Aquiles que retorne a guerra. Esses conceitos existem do mesmo modo no mundo dos deuses; há também uma assembléia entre os imortais. Isso tudo apenas comprova que as instituições divinas são baseadas no que Homero conhecia das instituições humanas.

O que ocorreu, não só na mitologia, foi que os sentimentos conhecidos pelas pessoas uniram-se à noção do divino. O politeísmo é, de fato, uma forma religiosa estritamente conectada ao mito. Esses deuses que, inversamente ao que estamos acostumados a tratar, foram criados à imagem e semelhança dos humanos tornaram-se o fio condutor dos poetas. A partir dessas divindades, as histórias eram traçadas e um novo universo construído. Não é como se o politeísmo não existisse até então, existia, sim, mas os mitos vieram somente a fortificar essa forma religiosa.

É impossível concluir que todos os aspectos transmitidos por Homero em sua obra não foram inspirados no que ele próprio viveu. Talvez seja esse o motivo por qual o poeta fez-se entender tão bem por seus espectadores e tenha sua obra lembrada até hoje.


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