sábado, 10 de julho de 2010

Godard e Truffaut são os personagens de documentário


  O documentário Godard, Truffaut e a Nouvelle Vague tem como personagens os dois diretores franceses.


BRUNO SCUISSIATTO

O diretor francês Emmanuel Laurent é o responsável pelo documentário Godard, Truffaut e a Nouvelle Vague, que  trata da amizade e ruptuta  entre dois dos maiores cineastas franceses de todos os tempos, no caso, Jean Luc Godard e François Truffaut. Abaixo a entrevista com diretor na revista Bravo, edição de julho.



BRAVO!: Como se iniciou o seu interesse pela Nouvelle Vague?

Emmanuel Laurent: Os filmes de Truffaut me tocaram desde muito cedo e me mostraram que eu poderia fazer filmes. Tenho uma forte ligação com Jean-Pierre Léaud. Ele é o meu irmão mais novo por assim dizer. Esse é o motivo que me levou a fazer filmes. Quando comecei foi como editor de filmes e Godard é um grande exemplo de como se editar filmes. Esta foi a sua maior contribuição ao cinema.

B!: Porque focar na relação entre esses dois cineastas em um documentário?

EL: Alguns anos atrás, conheci Antoine de Baecque que estava estudando a história da Nouvelle Vague e escrevendo uma biografia sobre Godard. Nós queríamos fazer um filme sobre o movimento, mas sabíamos que fazer um filme sobre a Nouvelle Vague é uma tarefa difícil que já foi feita antes. Algumas vezes muito bem. Pensando nisso, percebemos que ninguém tinha feito algo sobre a amizade deles. Então nós decidimos contar a história dessa amizade muito rara, forte e profunda e que se confunde com o que acontecia na França naquele momento. Mostrar como eles lidaram com a situação política do país e falaram com uma geração. Além das peculiaridades como o quanto eles se financiaram mutuamente e como Godard roubou várias coisas de Truffaut para fazer como se fosse seu. Eu acredito que era uma relação maravilhosa.

B!: Qual é o maior legado que a Nouvelle Vague deixou ao cinema mundial?

EL: Nós não pensamos filmes do mesmo jeito desde que eles vieram. Antes das críticas que faziam como jornalistas, o cinema era visto como um entretenimento popular, não era visto de maneira séria. Naquela época se dissesse que Hitchicock era um grande artista você seria visto como louco. Ele não era era reconhecido por mais ninguém a não ser por eles. O cinema num geral era mal visto e o cineasta menosprezado Quando se falava em cinema, se falava em escritores (literatura) e atores (teatro) não em como se faz um filme, a luz, a construção, a edição ou qualquer outra coisa. Foram eles que transformaram o significado de fazer cinema em algo relevante a ser estudado e fizeram com que se começasse a pensar em direito autoral, "um filme de tal pessoa".

B!: É Mais fácil fazer um filme autoral hoje em dia?

EL: Eu não acho que seja fácil. Acredito que é uma batalha que nunca está ganha. Você tem que continuar lutando porque luta contra um sistema. Os produtores de cinema não querem perder dinheiro. Na Nouvelle Vague era feito esse tipo de filme que ninguém sabe o que esperar. Foi uma luta bem difícil para eles e ainda é.  Sempre existem águias contra o sistema de produção norte-americano, mas nem sabemos no que estão trabalhando.

B!: Como os integrantes da Nouvelle Vague procediam?

EL: Eles faziam filmes de baixo custo financiados pelo lucro do anterior. A ideia é tentar fazer muito sucesso para poder fazer um filme maior que o outro até explodir (rs).  Nós temos um exemplo disso atualmente que é o cineasta francês Roger Vadim. Ele fez filmes mais complexos do que caros e todo mundo se esqueceu dele, ninguém mais assiste aos seus filmes. Esse é um risco. Hoje se faz muitos filmes independentes, pois eles não perdem dinheiro, mas poucos assistem.

B!: Mas agora com o youtube todos podem ter acesso a essas produções independentes, não?

EL: É verdade. Com uma câmera digital, que não custa muito, você pode fazer um filme sozinho no seu quarto. Mas também é mais difícil ter um empenho estético e encontrar um estilo cinematográfico. Tenho certeza que há grandes cineastas fazendo esse tipo de trabalho, porém não é um grupo fazendo um movimento para este tipo de trabalho. Você pode postar na internet, mas como as pessoas saberão que aquilo existe? Como formar um tipo de grupo, escola e dinâmica sobre isso? Na Nouvelle Vague eles criaram uma dinâmica. No final de sua carreira todos ouviam o que Truffaut tinha para dizer. Ele era tão poderoso e seus artigos eram tão fortes que todos falavam sobre ele. E, com certeza, o lançamento de um filme seu era o evento do planeta. Então, como você encontra o ponto? Só porque você faz, você vai atrair centenas de pessoas? Você tem que encontrar alguma coisa duradoura.

B!: Existem regras para se fazer um filme?

EL: A palavra-chave pra mim é sinceridade. Eu acredito que essa é uma palavra muito importante para explicar como Truffaut e Godard faziam seus filmes. Por isso os trabalhos de Truffaut eram tão tocantes, porque eles eram muito verdadeiros sobre a realidade de sua vida. Godard era por outro motivo. Ele falava sobre o hoje, procurava lugares e pessoas que representassem a atualidade. Esse era o grande talento dele que tinha um excelente cameraman vindo dos noticiários, tentando buscar o realismo a todo o momento.

B!: Os cineastas da Nouvelle Vague sempre tinham uma mensagem a transmitir através de seus filmes. Qual é a sua?

EL: Sobre este filme, eu acredito que é uma história importante a ser contada e recontada. A melhor coisa que fazemos com a Nouvelle Vague é compará-la com os pintores impressionistas. Os pintores impressionistas tinham teorias maravilhosas contra a academia e ganharam, mas a academia veio de novo e surgiram os novos impressionistas. A ideia é que todas as gerações precisam lutar e encontrar a estética do seu tempo. O tempo da Nouvelle Vague não existe mais por isso não deve ser copiada. Você tem que encontrar o sentido de hoje.

B!: Você tem projetos para um novo filme?

EL: Com certeza. Eu ainda não morri (rs). Escrevi um livro sobre uma modelo do impressionismo chamada Victorine Meurent. Ela era uma modelo de pintor Edouard Manet  vinda da classe operária. Ela se tornou uma pintora, mas suas telas se perderam e pouco se sabe sobre ela. Eu mesmo não sabia até que passei quatro anos coletando e pesquisando coisas e escrevi o livro Mademoiselle V.. Agora sei bastante e pretendo fazer uma ficção baseada em toda a sua vida. Será gravado em inglês e tem o título provisório de Diário de uma garota operária.

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